31/05/2009

Tristeza: acabou a exposição (Ou: saudade da Mãe Preta)

É preciso sofrer depois de ter sofrido, e amar, e mais amar, depois de ter amado.
Guimarães Rosa


Autor: José Carlos Lima
O que: Diálogo Com Mulher Batendo Algodão
Onde: Parque de Exposições Agropecuárias de Goiânia
Quando: 2009
Como: Com Celular Nokia 6120 Classic


Não resisti e conversei com esta spin fiandeira.
Maravilha este contato com coisas da minha infância.
A Mãe Preta, mãe de pegação, que por aqui chamam de parteira, era tecelã.
Uma negrona que andava no sertão, sob o sol quente, fazendo partos.
Ela andava léguas e léguas a pé e nada cobrava por seus serviços.
Sempre nutri um grande carinho por Mãe Preta, a quem olhava com admiração.
Incrível como estas coisas importantes ficam para trás.
Quando saí do mato para residir numa pequena cidade eu tinha 9 anos de idade, não me lembro de ter-me despedido de Mãe Preta, nunca mais a vi.
Quando a gente é pequeno é levado pelos pais.
Meus pais e as pessoas do sertão se arrancam dos lugares apressados, uma emergência que não permitia nem mesmo a despedida.
Conversar com estas fiandeiras no Parque de Exposições de uma certa forma compensou isto.
Talvez não, uma vez que a saudade me doeu lá fundo no coração.
Ali por volta dos 7 ou 8 anos de idade tive o maior interesse em participar da produção do meu próprio cobertor, sendo que eu não participaria apenas da tecelagem, uma vez que o tear ficava na casa da Mãe Preta, bem longe, não cheguei a ir na casa dela.
Participei de todas as fases, plantei o algodão, colhi, tirei os caroços, bati, fiz os fios, tingi, preparei os novelos e entrei para a Mãe Preta fazer o cobertor no tear.
Quando ela trouxe o cobertor pronto, colorido, não acreditei que aquilo teria sido possível
Oh, que saudade da Mãe Preta.
Que mundo cruel, separa as pessoas das coisas mais importantes, estas rendeiras, tecelãs e parteiras que tem a todos como seus filhos.
Agora mesmo conversei com um amigo ao telefone sobre isso.
Eu: acabei de chegar da Pecuária, tive contato com coisas da minha infância.
Ele: o que?
Eu: as fiandeiras.
Ele: ah sim, quando eu morava em Xambioá, de madrugada eu ouvia a Dona Geralda batendo algodão. Pa pa pa pa pa pa pa. A batida provocava um som relaxante.
Eu: ela usava o que?
Ele: duas varinhas. Ela colocava o algodão sobre um suporte, um saco com recheio de algodão ou colchão, depositava o algodão em cima e batia com as varetinhas. Ela fiava, passava por várias etapas até chegar à tecelagem. Ela fazia roupas, redes, cobertores, tudo muito bonito.
Eu: que bacana, heim.
Ele: ela tratava a gente como filhos dela. De manhã cedo ela nos servia beiju de tapioca acompanhado de café com leite de coco.
Eu: o povo da roça tem este tipo de consideração mesmo.

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