22/10/2007





3/73 - IV/A-2007

Neoconcretismo

Por Edson Barrus ( via email)

"se criou uma teoria e uma interpretação do movimento (neoconcreto) que eu acho que não corresponde exatamente à verdade. Então, eu digo: é necessário botar as coisas nos seus devidos lugares, até para as pessoas compreenderem que é um movimento importante da arte brasileira."

Esta declaração do Ferreira Gullar na Folha de São Paulo de hoje por ocasião da promoção do seu livro "Experiência Neococreta" vem acompanhada de uma critica do Flavio Moura que solicita o temor manifestado por Ronaldo Brito para dar sentido à versão deste que tem assento garantido no panteão da cultura brasileira, E o critico da folha escreve ainda: "O ponto é que a cotação do Neoconcretismo subiu em ritmo vertiginoso nos últimos tempos. A acolhida festiva das obras de Hélio Oiticica e Lygia Clark no exterior, (...) contribuíram para fazer dos neoconcretos os agentes da "emancipação" da arte brasileira."

Que nem o neoconcretismo nem o Ronaldo sejam transformados em "imagem cívica" e justifiquem a historia de um silencio que me grita ha alguns dias, pedindo passagem para entender alguns pontos que estas falas detonam.

Trata-se do evento produzido em Houston, EUA. promovido pelo prestigiosissimo The Museum of Fine Arts envolvendo as pessoas não menos pretigiosas de Mari Carmem Ramirez e Yve-Alain Bois, Ronaldo Brito, Paulo Herkenhoff e Paulo Sérgio Duarte, todos validando a Arte como o que merece reconhecimento do circuito, e por esse auto-reconhecimento se pratica falas e silêncios estrondrosos como o que atravessa o circuito agora.

Tomei contato com o Yve-Alain Bois na Escola de Belas Artes da Universidade do Rio de Janeiro durante os meus estudos de mestrado pela tradução de 2 de seus textos: um sobre a poética do peso na obra de Richard Serra publicado na revista norte-americana ArtForum e o célebre texto "l'Informe, mode d'emploi" .

Era o momento da exposição "rounds" de Richard Serra no Centro Hélio Oiticica , quando levado por esse frisson conheci o Ronaldo Britto em uma palestra lotada, na qual ele exercia toda a sua autoridade dizendo que se o Serra fosse um artista brasileiro iria pastar uns 15 anos. Motivo: o Serra gostou das três bolas pequenas que fez na passagem entre os pisos inferior e superior.

Presenciei também um exercício de autoridade do Paulo Herkenhoff diante de uma platéia autodenominando-se escolhedor, e que a ele competia escolher.

Vi o Paulo Sergio Duarte ser tratado de cacique por acasião da grande recusa carioca ao museu Guggenheim ; sempre me perguntei como esses tons se produziam dentro do circuito da arte? d'onde essas falas se sustentavam? E percebi um grande sistema hierárquico que vê a arte como exercício de poder , e que só-brevive neste jogo.

Rosalind Kraus sem se distanciar dessa concepção institucional, diz que a historia da arte moderna, e creio que a interpretação se estende aos nossos dias, é a historia do Muro Branco do museu e as tentativas de atravessamento desse muro.

É ingênuo pensar que os que tentam atravessar esse muro são somente os artistas. Os críticos, curadores, historiadores e galeristas, também disputam esse lugar juntos e/ou separados com estratégias as mais diversas.

Nesse sentido o Hélio e a Ligia atravessaram o Muro Branco e a Critica Neoconcreta foi rejeitada.

Trago esses fatos aqui para pensar esse estado de pasto.

Vejo naqueles que não conseguem atravessar o muro branco do museu, os que ficam pastando na verde e extensa pastagem, ilustrando uma outra condição dessa paisagem de poder, apontada pelo mesmo Ronaldo Britto.

É essa condição de pasto que interessa aqui falar: quem manda e quem vai para o pasto?

Porque se as coisas se dão nesses termos, surge a pergunta se quem ta no pasto pode ainda mandar e para que pasto?

Evideciar diferenças entre pastos de alfafa e braquiaria, creio que não responde por quanto tempo vamos continuar pastando; e o estrondo do silencio, sugere um longo período.

Até perdermos a pertinência de fazermos perguntas que nos aponte outras direções.

Pois quando uma critica que se exerce como juízo de valor é desvalorizada por esse mesmo juízo, que valor adquire?

E o mercado editorial vai continuar indiferente a tudo isso?

As galerias e os artistas vão continuar desejando ainda textos vindos de pensadores rebaixados no circuito internacional? O que nos deixa claro este acontecimento é que aquele que nos livra do pasto micropolitico, pode no jogar no pasto macropolitico.

Mas além do pasto, nos resta uma espécie de bolsão teórico.

Os textos desses autores são leituras obrigatórias, e afetam um tecido acadêmico que se ramifica por todo o pais e se estende além das fronteiras.

Podemos pensar aqui na quantidade de citações em teses e estudos acadêmicos e publicações.

Deve existir uma maneira de acessar essa conversa de Houston e traduzirmos para o português para arejar as nossas idéias com outras formas de pensar.

Seria necessário saber o que tão dizendo e pensando sobre o neoconcretismo não como algo cívico, mas com um valor que ainda merece consideração.

O problema que se coloca é que eu quero conhecer a opinião prestigiosa do Yve-Alain Bois, que leituras ele possibilita. seria corajoso colocar o argumento pro circuito ter oportunidade de se re/posicionar.

Se há fissuras no que aprendemos sobre o Neoconcretismo, sugerindo-nos outras leituras mais instigantes e criativas. Porque não?

Leituras talvez mais vivas como era o movimento, e o Hélio também que era vivíssimo. Mas isso me sugere repensar tudo.

Até o porquê de uma teoria que foi produzida colada a experiência neoconcreta não produzir interesse no campo ampliado da arte.

Vamos perder mais uma oportunidade de ouvir o que um critico dos mais interessantes como Yves Alain Bois tem a nos falar sobre o assunto nesse acontecimento de Houston? ou ficar reivindicando, como condição para começar a pensar, artesanato a um artista que manipula teclados e algorltimos?

Desconfio dos devidos locais que o Ferreira Gullar manifesta de botar as coisas, mas se conquistássemos um lugar de credibilidade na interpretação do neoconcretismo sinalizaria o amadurecimento do corpo teórico brasileiro.

Ou não?

edson barrus, 21/10/07

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