Por Fátima Oliveira - Médica - no blog viomundo
fatimaoliveira@ig.com.br
A INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA NECESSÁRIA NÃO É CRIME
Ainda sobre sofredores mentais em "crise", quando a família não consegue mais lidar com o estágio de descontrole da doença e busca um "meio médico" de alívio para seu doente e uma trégua para si, saltam aos olhos as interpretações distorcidas dos artigos do poeta Ferreira Gullar: "Uma lei errada" (FSP, 12.4.2009); "A sociedade sem traumas" (FSP, 26.4.2009); e "Os inumeráveis estados do ser" (FSP, 17.5.2009).
Gullar conviveu por meio século com dois filhos esquizofrênicos e construiu na dor credenciais morais para emitir a sua percepção de como a Política Nacional de Saúde Mental se concretiza no cotidiano das famílias e dos doentes. Não precisamos concordar, apenas admitir que falou do alto da experiência de pai-cuidador e que seus artigos brotam dum contexto especialíssimo: conhece a fundo o assunto. Embora ame a poesia do meu conterrâneo, não morro de amores pelo Gullar analista político, mas como ousar desqualificar uma voz de experiência de décadas?
É imoral quem nunca ardeu, queimou e renasceu das cinzas, como Fênix, na lida com um familiar transtornado mentalmente tentar desacreditar quem, em nome da ética da responsabilidade, cuida do seu dizendo: "este poeta se manifesta frontalmente contra a Política Nacional de Saúde Mental brasileira e declara seu apoio decidido às práticas de internação (...) e que o que está certo é a lógica manicomial que o Brasil está deixando para trás" (Luciano Elia, psicanalista, diretor do Laço Analítico e consultor do Ministério da Saúde para a Saúde Mental de Crianças e Adolescentes).
Ignorante da frase "Seja qual for o caminho que eu escolher, um poeta já passou por ele antes de mim" (in "Freud e os poetas"), tripudiou: "Não está sozinho, Gullar, e talvez não tenha tomado esta iniciativa de moto próprio, de moto solo. Há profissionais, em sua maioria psiquiatras sequiosos por retomar o curso retrógrado da assistência psiquiátrica". Ora me compre um bode!
A lei nº 10.216 - que "Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental" - diz, sem rodeios, que é um direito da pessoa portadora de transtorno mental: "I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades" (art. 2°, parágrafo único); e não se omite e nem criminaliza a internação necessária, ao contrário, a prevê: "Art. 6°. A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus motivos. Parágrafo único. Tipos de internação psiquiátrica: I. internação voluntária: com o consentimento do usuário; II. internação involuntária: sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiro; e III. internação compulsória: determinada pela Justiça".
Não vamos dourar a pílula: não é fácil amar o desviante do padrão de normalidade, pois é extenuante amar a quem só dá trabalho. Atire a primeira pedra quem disser o contrário. É esperado que muitas famílias, no auge do desespero, acalentem o desejo de segregá-los ou de se "aliviar" por uns tempos "forçando a barra" para uma internação. Cotidianamente, vejo tais desejos de alívio no Pronto Socorro em relação a pessoas idosas, inválidas ou doentes terminais. É cruel, mas é real. Ferreira Gullar não declarou "apoio decidido às práticas de internação" e nem advogou pelo retorno das masmorras dos manicômios... O debate tem de elevar o nível para ser sério, pois "quando nem Freud explica, tente a poesia"!
Publicado em: 09/06/2009
www.otempo.com.br/otempo/colunas/?IdColunaEdicao=8746
www.josecarloslima.blogspot.com
Sabe o que acho? Que há cruzes e cruzes. E pessoas e pessoas. E famílias e famílias. Não venham me dizer que não é uma cruz o cuidado com doentes mentais. Sempre é. Uns mais, outros menos. Agora ter de aguentar uns tais especialistazinhos dizerem que a família tem de aguentar tudo até morrer, ser assassinada, é demais. O governo tem de arcar com a sua responsabilidade também de apoiar o doente sempre que uma internação for indicada tbém. Não é o que está acontecendo. Há doentes mentais que dá pra conviver numa boa naquele sofrimento todo que só quem toma conta deles sabe. Mas há uns que não dá. Ou não dá em determinado tempo.
Marcia (08/06/2009 - 21:27)
Acho que quem criticou foi o pai, não o poeta.
O assunto é controverso.
Tenho duas tias que viveram dentro e fora de hospitais psiquiátricos, eram PMD , bi polar, em estado muito evoluuído da doença. Uma delas morava conosco e quando entrava em crise fazia horrores impublicáveis.
Não sou a favor de depósitos de doentes, mas há casos e CASOS.
Muito bem Fátima! Eu sei, na vida, o que é isso!
________________________________
ps1
Esqueci de dizer clique uma vez na imagem para ampliar.
Esqueci também de dizer que as imagens acima foram colhidas no meu orkut e trata-se de uma performance inspirada nos parangolés de Hélio Oiticica, em primeiro plano o formidável artista e professor Antônio Pinheiro.
ps2
Lygia Clack
ps3
Esqueci de dizer clique duas vezes no vídeo para ampliar
ps4
Esqueci de dizer a frase aleatória no SPIN
Frases Aleatórias no SPIN
Inté.ps 5
No versículo anterior esqueci de dizer que é de bom alvitre enviar o link deste post para o meu twuitter, ocorre que ontem não dei conta de postar um recado, e nem tenho tempo.
não sei mexer com esta ferramenta
Vou ficar somente no orkut
Por falta digo excesso de precaução, ou seja, para não destruir estas postagem, o que adoro fazer após minhas criações, destruo tudo o que faço = crio = olho = sou
A este respeito leia os livros sobre a teoria da auto-sabotagem
Para evitar que eu pratique auto-sabotagem por aqui esta obra continua hoje, ou seja, no 14º dia útil
Para ir ao dia de hoje clique uma vez aqui
Inté.
Lembrete: marcar o post com as tags = palavras = chaves
quiridão,
ResponderExcluirgullar também lia merleau-ponty e ajudou a escrever o manifesto neoconcreto. não fale do que não sabe. nem dicionario fala sobre arte de forma tão rasa quanto seu comentário.
abraço,
Resposta ao Anônimo:
ResponderExcluirMantenho minha afirmação.
Ferreira Gullar não só negou o neoconcretismo, como passou a confrontar o artistas que o citavam.
Para que se informes melhor, sugiro que leias o livro Ferreira Gullar. Experiência neoconcreta: momento-limite da arte. Ed. Cosac Naif, 2007.
Outro ótimo texto que confirmam minha afirmação sobre Ferreira Gullar foi escrito pela jornalista e pesquisadora de arte Cristina Bianco:
“(...) Em “O tempo e a obra”, Gullar deparou-se com a idéia que o afastou do grupo carioca: a de que “a própria noção de arte deveria ser abolida, já que o não-objeto não pretende inserir-se na cultura nem quer permanecer, durar: o que dele restará será apenas a casca material já que, enquanto significação, será absorvido na elaboração e reelaboração incessante de nossas experiências sensíveis”.
O crítico deu-se conta de que destampava a caixa de Pandora: na poesia, sua perspectiva era de abandono da própria palavra. Tais idéias, pressentia, levariam à destruição da arte.
Assustado, Gullar abandonou os neoconcretos: primeiro timidamente, em 1961, quando dirigiu a Fundação Cultural, em Brasília, a convite do então presidente Jânio Quadros; depois assumidamente, em 1962, quando passou a presidir o Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes. (...)"
Este texto é ótimo. Leia-o na íntegra, segue link:
http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=859
pois bem, a critica dele refere-se ao desenvolvimento do neoconcretismo e uma (invevitável) transição para a "arte contemporânea", posição esta que não necessariamente o realinha ao dogmatismo concretista.
ResponderExcluirEste assunto pintou por aqui por conta da oposição de Gullar contra a luta antimanicomial, que consiste em trocar a velha forma de ver e tratar os portadores de transtornos mentais por um modelo mais humanos para os pacientes.
ResponderExcluirNa verdade Gullar é um inovador mas até certo ponto. Quando há um aprofundamento, o que ele chama de radicalização, ele cai fora. Talvez por isso ele oponha-se de forma tão ferrenha aos princípios da anti-psiquiatria (rompimento com a psiquiatria tradicional).
Gullar tem repetido este comportamento também no campo da estética.
Senão vejamos:
Ele(Gullar) foi peça fundamental nos movimentos concretos e neoconcreto. No entanto, quando o concretismo radicalizou, ou seja, quando se buscou uma poesia ainda mais matemática ou matematicamente sensível, Gullar caiu fora.
Mais uma vez, quando o neoconcretismo radicalizou, se aproximando disto que hoje chamamos de arte contemporânea, mais uma vez Gullar caiu fora.
Reconheço o valor de Gullar para a arte brasileira.
O que ocorre é que o mundo gira, as coisas andam, se aprofundam, enquanto ele (Gullar), parece ter como prática dar o ponta-pé inicial no sentido do avanço para, logo em seguida, parar.
Na verdade eu quis dizer que Gullar ainda vive sob os parâmetros do movimento concretista embora tenha rompido com este movimento do qual participou.
ResponderExcluirReconheço que meu comentário foi bastante truncado, relendo-o vejo isso, desculpe-me se em algum momento fui ríspido. Nesta vida o que vale mesmo é amizade.
Abs,
jose carlos lima (08/06/2009 - 23:27) Gullar ainda vive sob os parâmetros do movimento concretista. Este movimento defendia uma poesia racional, matemática. O concretismo foi substituido pelo neoconcretismo. O neoconcretismo trouxe loucos do quilate de Hélio Oiticica e Lygia Clarck. A não ser que Gullar tenha reformulado suas idéias dias atrás, mas até recentemente ele atacava o neoconcretismo. Assim como ataca também o avanço no campo da psiquiatria.
Anônimo, tem esta missiva no blog Azenha
ResponderExcluirJosé Carlos Lima (11/06/2009 - 08:31)
Opa opa, o que eu quis dizer é que Gullar apesar de ter rompido com o movimento concreto ainda vive sob os parâmetros do concretismo, não avançando, parando no tempo, embora tenha dado o ponta-pé inicial. Segue link de texto no meu blog, espero que fique claro o meu ponto de vista.
http://josecarloslima.blogspot.com/2009/06/neoconcretismo-x-ferreira-gullar.html
Segue link da postagem no blog do Azenha
http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/a-internacao-psiquiatrica-necessaria-nao-e-crime/
Abraço,
José Carlos Lima
ok, agora ficou claro
ResponderExcluirCaro opa opa, verificando um email que eu havia abandonado descobri um texto de 2005, notei que transformei-me num spin rude, falso, truncado. Naquela época eu era spin fluente.Não sei o que ocorreu comigo, o que me levou a este estado de decadência.
ResponderExcluirEste é o texto da época em que eu era livre
http://josecarloslima.blogspot.com/2009/06/enc-urano-capitulo-5.html
Onde eu estava para perder-me, esquecer-me.
Agora noto que transformei-me num monstro petrificado. Noto que Ferreira Gullar foi acometido pela mesma síndrome. Precisamos nos recuperar. Nem tudo é lixo. Incrível esta mania nossa, eu e Gullar, de nos deletarmos.
Eu sou paciente psiquiátrica e pra mim que sofro doença mental, vos digo que os antimanicomiais prejudicam a saúde psiquiátrica do doente de verdade.
ResponderExcluirSe o doente precisa de tratamento deve buscar o hospital, se o usuário saúde mental quer fanfarra deve buscar os Naps, Caps ou Cersam.
Abaixo à ditadura antimanicomial