01/02/2010

Há um esforço de setores da sociedade em apagar a ditadura da história do país, diz filósofo

Gilberto Costa
Repórter da Agência Brasil

Brasília - Após a Segunda Guerra Mundial, os judeus sobreviventes revelaram que seus carrascos asseguravam que ninguém acreditaria no que havia ocorrido nos campos de concentração. A história, no entanto, não cumpriu o destino previsto pelos nazistas, muitos foram condenados e o episódio marca a pior lembrança da humanidade.

Crimes cometidos em outros momentos de exceção também levaram violadores de direitos humanos a serem interrogados em comissões da verdade e punidos por tribunais, como na África do Sul, em Ruanda, na Argentina, no Uruguai e Paraguai.

Para filósofo Vladimir Safatle, professor da Universidade de São Paulo (USP), há um lugar que resiste à memória do horror e a fazer justiça às vítimas: o Brasil. Nenhum agente do Estado ditatorial (1964-1985), envolvido em crimes como sequestro, tortura, estupro e assassinato de dissidentes políticos, foi a julgamento e preso.

Em março, será lançado o livro O Que Resta da Ditadura (editora Boitemço), organizado por Safatle e Edson Teles. A obra tenta entender como a impunidade se forma e se alimenta no Brasil. Para Safatle,o Brasil continua uma democracia imperfeita por resistir a uma reavaliação do período da ditadura militar (1964-1985) e por manter uma relação complicada entre os Três Poderes.

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Desafio da Comissão da Verdade será ter acesso a arquivos das Forças Armadas

Gilberto Costa
Repórter da Agência Brasil








Brasília - A Comissão Nacional da Verdade deverá ter um grande acervo de documentos sobre a perseguição a dissidentes políticos durante a ditadura militar (1964-1985). O Arquivo Nacional dispõe dos papéis e registros dos setores de informação e monitoramento do Ministério da Justiça, do Ministério das Relações Exteriores, do Ministério das Comunicações e de universidades públicas. Além desses, há informações de investigações da Polícia Federal à época do regime.

Há também dados mais recentes, como os produzidos após a redemocratização. Três incursões ao Pará e Tocantins renderam mais de 300 depoimentos sobre a Guerrilha do Araguaia (ocorrida no começo dos anos 1970); os oito anos de trabalho da Comissão da Anistia do Ministério da Justiça acumularam 60 mil processos sobre perseguições, demissões arbitrárias, tortura e exílio nos 21 anos de regime militar. Ainda há acervos como os do Brasil, Nunca Mais e de particulares como do Major Curió sobre o Araguaia, revelado no ano passado, e que o Ministério Público tenta obter.

“A Comissão da Verdade não realizará seu trabalho partindo do zero”, diz Paulo Abrão, presidente da Comissão da Anistia. Ele espera, no entanto, que a comissão tenha acesso aos arquivos da inteligência do Exército, Marinha e Aeronáutica. “O desafio da Comissão estará em chegar a esses documentos e verificar sua veracidade”, disse à Agência Brasil. Desde a redemocratização na década de 80, os militares afirmam, no entanto, que os documentos desses centros de informação foram destruídos.

Paulo Abrão é um dos seis membros do grupo de trabalho (GT) nomeado na última quarta-feira (27) pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, para elaborar até abril o anteprojeto de lei que institui a Comissão Nacional da Verdade. Os outros participantes são Erenice Guerra (secretária executiva da Casa Civil), ministro Paulo Vannuchi (Direitos Humanos), Vilson Marcelo Vedana (consultor jurídico do Ministério da Defesa), Marco Antônio Barbosa (presidente da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos) e Paulo Sérgio Pinheiro (ex-secretário de Direitos Humanos, representante da sociedade civil no GT). A Casa Civil coordena os trabalhos.

Para o presidente do Clube Militar, general Gilberto Figueiredo, “à primeira vista, a formação do grupo parece completamente desequilibrada. Parece difícil pensar em isenção”. Em sua opinião, o GT poderia ter um representante do Ministério da Defesa, um da Secretaria dos Direitos Humanos e os demais seriam historiadores e cientistas políticos que “examinem os fatos, sem a carga de paixão”. O general disse não ver problemas na instalação de uma comissão da verdade, “para verificar o que realmente ocorreu”.

Na avaliação do cientista político Paulo Sérgio Pinheiro, “essa coisa de dois lados é conversa fiada. Só há um lado para se apurar: o da responsabilidade dos agentes do Estado”. O ex-secretário pontua que o GT e a Comissão Nacional da Verdade deverão trabalhar com base no diálogo e no que já está previsto em lei; como a Lei nº 9140/95, que reconheceu como mortas as pessoas desaparecidas durante o regime militar.

O presidente da Comissão da Anistia, Paulo Abrão, reforça a necessidade de diálogo e também descarta que haja dois lados para serem apurados. “Não podemos raciocinar nesses termos. O pressuposto primeiro é que todas as partes têm intrínseca vontade em apurar a verdade”


FONTE: Agência Brasil
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